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9.5.13

Intuição ou preconceito?

Rosilda e seu celular, sempre comentando

- Esse mundo tá violento demais.
- É, esse mundo não é mais prá nós. Só penso agora nas gerações futuras.
- Pois é ela mesma é que está pegando pesado, não está vendo essa questão da maioridade penal?
- Leis, leis, leis. Aqui as leis são um "abracadabra", resolvem tudo de uma penada.  Viu projeto de cotas pra dependente químico, é ou não é um estímulo? "Drogue-se bastante e candidate-se a uma cota!"
- Falando em politicamente correto, não te contei não?
- O que?
- Nossa, do assalto!
- Que assalto?
- Sexta à noite, no ônibus! Nessa sexta!
- Pô, amiga, como não me contou um babado forte desse?
- Sei lá, falta de oportunidade, lembra  fiquei no Rio, pro  aniversário em Ipanema?
- Hãhã...
- Pois é, saí de  lá pelas nove da noite, até porque depois disso, você acaba rodando bolsinha na rua, não acha nem Uber pra Niterói...
- Ai, prefácio, introdução...
-  Pois é, como não era tão tarde, peguei o Charitas, o ônibus estava mais ou menos vazio, era um frescão, da metade prá trás estava cheio, e na frente ocupando cadeiras do mesmo corredor, dois caras isolados, trocando ideia baixinho...
- Hum..
- Até aí nada demais, só que todo mundo que entrava eles tiravam uma linha, avaliando, cochichando, um tanto ostensivos...e de vez em quando olhavam prá trás, meio que disfarçando...
- Já vi que ficou tensa. Eu também ficava.
- Claro. Bate aquela dúvida, desço-não-desço, mas àquela hora, não dava. Segui cismada e espalhando discretamente cartão de banco e documentos pelo sutiã, coisa que pra mim, é o pior. Foi então que resolvi sentar ao lado de uma moça, depois de alguns minutos,e contei a minha aflição.O ônibus devia estar entrando na ponte nessa hora.
- E ela...?
- Ela? Acredite! Me deu uma espinafração, só porque os rapazes eram negros,  eu não tinha esse direito, se fossem brancos eu nem ia ligar, ih, que o povo brasileiro era hipócrita e preconceituoso,blá-blá, fez um discurso que só vendo, indignada, eu cada vez mais me afundando na poltrona, de vergonha, com medo dos dois escutarem, e até me vi enquadrada na Lei Afonso Arinos.
- Xi, eles escutaram?
- Não sei, ela nem falou muito baixo. Que vergonha, Rose! Ainda tentei me defender, que não era por causa da cor , mas da atitude deles, era só má intuição, acabei pedindo desculpas, licença, e mudei de lugar, arrependida pro resto da vida  de ter falado aquilo.
-  Chato mesmo, e aí?
- E aí,  pouco depois de passada a ponte,  um deles foi pra cabine do motorista, fêz ele parar, e o outro percorreu o corredor, portando uma arma ou algo parecido sob a jaqueta, e sem nervosismo, diz que todos ficassem calmos,  que ninguém ia se machucar, só queriam celular,  e carteiras, e vão recolhendo tudo, botando na mochila, só sei que foi tudo muito rápido. Desceram na boa, rindo e desejando a todos boa viagem,  atravessaram a pista, deserta àquela hora, e sumiram ! Fiquei sem a carteira, não tinha nada dentro. O celular não levou, não era de grife;
- Meu Deus!
- Em seguida fomos pra delegacia, e foi aquela coisa toda, B.O. e tal.
- E a tal moça-do-preconceito, que te deu a bronca, devia estar sem-graça, heim? Depois daquele discurso todo...
- Sabe que, na confusão,  não sei onde ela se meteu... ? Nem  na delegacia  vi. 
- Que coisa, heim?
- Não, mas olha, você me conhece, se tem uma pessoa que não tem preconceito, essa  sou eu.E foi logo comigo!
- É verdade, amiga, assino embaixo. Agora, de qualquer forma, por favor, se bater em você uma intuição dessa, e eu estiver por perto, me avisa, tá?

     (Baseado em fatos reais)

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